Quanto tempo caminhei aqui, escondidinha, falando e falando sem parar. Talvez fosse como hoje, essa necessidade premente que não cala, não sossega, não se cansa nunca de me arrastar atrás das palavras, de cada letra, de cada música. Essa emoção que se cala diante da beleza do poema, que para de respirar e levanta 20 centímetros da água azul, do território da alma, chão de poesia. Como lidar com o turbilhão que cresce dentro o peito até quase explodir? Como acalmar a ânsia desesperada de escrever tudo que me passa, tudo me sinto, tudo que me sou quando, no silêncio ou na ternura, em você, eu timidamente eu toco? Como expressar sentimentos sem falar utilizando palavras? Suspiros não tem letras, lágrimas não tem teclado, coração não é uma pedra esquecida na calçada, não é o lixo acumulado no meio da rua. Mas, ao contemplar de tudo, a vida se mescla, se confunde e, absurdamente, se cala... sem palavras... é quando falam as reticências, quando gritam os pontos de exclamação, quando se inserem os parêntesis, tentando explicar, acrescentar algo que vá além das palavras, algo que chegue até você e atordoe o espírito, que balance a tua vida a ponto de quase despencares da corda bamba da vida onde te equilibras todos os dias. Esse desejo de cortar a carne, dilacerar a alma até que a minha presença seja percebida, mesmo que sem palavras, sem um som, sem um sopro de falta de palavras. E a boca regurgita o que leu, o que sentiu, o que percebeu, o que tocou, o que queimou, o que cortou e o que feriu. Se as adagas se erguem os facões voam na mesma direção, como aquele homem do circo que retira as facas de sua cesta e as joga na maçã sobre o rosto querido. É quando as palavras precisam encontrar a força descomunal dos sentidos para poder expressar com glória a raiva, a dor, o sofrimento, a alegria, a felicidade, a paixão e o amor. E mesmo tudo posto, ainda faltam palavras... então fala-se pela música dos olhos, pela magia de um passeio sereno num jardim de sonhos, dando as mãos a princesas e rainhas, acarinhando e domando leões, beijando nuvens e montanhas, tocando flores com os pés, as mãos, o corpo... até que tudo se funda, num só magma, numa só chama da fogueira em brasa, para então explodir e subir aos céus, para então de novo cair... e voltar a escrever um poema inacabado...